domingo, 16 de outubro de 2016

Montenegro


Lago Skadar



Existem países diferentes, com as suas cores e os seus ritmos mais ou menos movidos. Existem países que escondem, que se agasalham, países que guardam, países vestidos ao contrário, para dentro dos pátios, outros para dentro das casas e outros para dentro dos quartos. Se há países tão diferentes, há países que dão com uma mão e tiram com a outra, há países que nada dão e a terra é seca, há países de luz e países de sombras, há países que exigem, outros que escondem e depois há aqueles países que dão, simplesmente dão.


Quando escrevi esta frase tinha acabado de chegar ao Montenegro, eu sabia que desde o início este é um país que dá. Agora passou um mês e continuo a acreditar, e não foi preciso muito para entender que a única coisa que Montenegro me pede é que exista, que acorde pela manhã e observe. Aqui a visão deve ser o sentido que devemos ter mais apurado, não existe um único pedaço de terra que não seja magnífico, não existe outra actividade que nos seja pedida senão a da contemplação. E contemplamos. Começamos com uma lista, um trabalho-de-casa de lugares, que agora são só promessas místicas: Perast, Durmitor, Biogradsko jezero, Ostrog, Kotor, Lovcén, Stoliv, Rijeka Crnojevica, Ada Bojana, Ulcinj, Piva, Žabljak, Rijeka Tara. A cada estrada percorrida Montenegro abre-se, vira-se para fora, dá tudo como mais não pode, não é possível caber mais beleza num pedaço tão pequeno de terra. Na minha cama na cidade real de Cetinje, onde regresso todas as noites, acordo rodeada de montanhas. Nas ruas cada vez mais frias empilham-se troncos à porta de cada casa para um inverno que sempre chega aqui primeiro e com mais intensidade. Dentro das casas coloridas moram pessoas simpáticas que não me entendem. Mas, tal como as paisagens, não tarda em que mesmo estas dêem tudo o que têm, todo o seu tempo, o seu interesse, a sua casa. E é assim que passa o primeiro mês, um mês onde somente recebo e eu, que tenho para dar?

sexta-feira, 10 de junho de 2016

O lugar que eu sou

Os dias passam depressa e em breve a hora
De voltar a dizer adeus às paredes brancas
E ao mar azul e agora
Eu não quero
Eu não quero dizer adeus eu não preciso mais
Que estas paredes alvas e que as ondas
Nada mais é preciso
Que acordar debaixo do sol
E atear lume na calçada
Há marés, meu amor, é como a gente
Que anda pelos montes como a corrente e eu
Arrastada mais longe
Arranco páginas ao calendário até chegar à última
E o relógio e as malas me esperarem na porta
E eu digo adeus sem estar preparada
Mas já aprendi a dizer adeus sem estar preparada
Então direi adeus de novo mas hoje
Antes dos dias vindos e ao passar o Rossio
Olho-o com amor e apaixono-me
Todos os dias como se fosse o primeiro
Todos os dias me apaixono
E quero chorar debaixo das arcadas
Quero correr à beira- rio à sua fronteira
Eu o amo tanto que não cabe cá dentro
E se vou embora procurando resposta
É antes de partir que esta me é dada
Aquela que procurava o lugar
Que eu sou.

terça-feira, 12 de abril de 2016

Cheia



Porque só eu sou cheia no desequilíbrio
Só cheia sou eu quando com fome
Vontade de cair se em terra firme
E coração vazio quando não sofre
Chamam-lhe paixão eu nem sei que chamo 
Mas chamo! Pela noite fora
Se só estou cheia quando com fome
Venha a neve e leve aqueles que dormem
E eu fique nua, pela tempestade;
Aquela que quer o calor do fogo
Mas que não vive sem o frio no rosto.

domingo, 14 de fevereiro de 2016

Namorados


Vivemos com a ânsia da morte. Todos os dias.
Ancorados na noite escura, ancorados debaixo das mantas, temos as pernas entrelaçadas, nós nos dedos indistintos, a pele sobre a pele, não sabendo onde um termina e o outro começa.
E abate-se assim a certeza desse último dia, que nos espera, assim como o primeiro já nos aguardou.
É nessa altura que tudo o que se segue se reduz a um segundo, e aflora-te uma lágrima no rosto, entendendo que um dia teremos de dizer adeus. Então, não nos vendo mais infinitos, damos esse abraço, um abraço apocalíptico, como os corpos em Pompeia, suspensos, enfrentando em par a derradeira erupção.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Taxonomia Psico-Linguística dos Snack-Bares e Estabelecimentos Similares Portuguêses


Depois de ter despendido várias horas a investigar a nomenclatura de snack bar no território de Portugal continental tenho a concluir que existem 6 categorias chave e que 98,4% dos nomes recaem numa destas categorias
  • Categoria 1 - Nome de personagens olvidadas de bonecos de animação, programas de televisão anteriores aos anos 80 ou expressões, sempre repetidas. Caem nesta categoria exemplos como Snack bar Tico Tico, Snack bar Zip Zip, Snack bar Trinca trinca ou Snack bar Upa-upa
  • Categoria 2 - Objectos, espaços públicos ou sinais de trânsito habitualmente ignorados pelo trausente comum, mas aqui homenageados, ganhando, finalmente, a sua merecida atenção. Esta categoria engloba a maior percentagem de snack-bares. Caem nesta categoria nomes como Snack bar a Rotunda, Snack bar o Canteiro, Snack bar o Púcaro, Snack bar o Beco, Snack bar o Gaveto, Snack bar o Stop, Snack bar o Charuto
  • Categoria 3 - Não tão vulgar, mas uma das mais impressionantes, engloba expressões imperativas, por vezes fundidas numa só palavra. Aqui temos como exemplo Snack bar Comejá, Snack bar Comicala, Snack bar Comecá
  • Categoria 4 - pode ser subdividida em duas categorias, mas iremos aqui englobar nomes relacionados com grandiosidade, exotismo, diversão e mistério, O peculiar desta categoria é a dualidade entre a expectativa criada pelo nome do snack bar e a indiferença da décor do seu interior. Recaem nesta categoria: Snack bar Galáxia, Snack Bar o enigma, Snack bar Austrália, Snack bar Ipanema, Snack bar Copacabana, Snack bar gente nova e finalmente, Snack bar telheiro do Texas
  • Categoria 5 - Associação directa entre dados do proprietário, do ano ou características de abertura do snack bar. Aqui temos exemplos como Snack bar o Zé, Snack bar o Virgílio, Snack bar 2002, Snack bar o primeiro
  • Categoria 6 - Categoria diminutivos, onde temos exemplos como snack bar o Bifaninhas
Título do artigo por David Oliveira