sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Intermitências



A descoberta é saber que gosto das intermitências. A vida cheia de capítulos e pontos e vírgulas.

Ir e voltar, partir e regressar.

Fala-se em emigrar, pois eu falo em viagens, fala-se em decisões pois eu falo em experiências, nada é eterno, é preciso partir e dormir bem longe para saber o tamanho da nossa cama. Foi preciso deixar para construir pontes. Foi o som do alaúde que me mostrou a amarantina, foram os altos pés direitos que me pediram baixas janelas. Nunca entendi como a minha terra era tão rasa, foi preciso ver o sol deixar de brilhar em Bruxelas e a noite eterna dos nórdicos para me lembrar como em lado nenhum o sol brilha como ali, como um manto de luz e brancos muros. Foi preciso provar peixe em muitas praças para descobrir que nada existe como o mercado ao lado da casa dos meus avós. Sou capaz de nomear mais de 15 variedades de bivalves, mais de 30 espécies de peixe, mais de 10 tipos de crustáceos. Pensava que todos sabiam. Foi assim que todas as coisas vulgares se tornaram únicas e preciosas. Foi assim que todas as coisas garantidas se tornaram frágeis. As manhãs a apanhar caranguejos com os meus pais. Os meus avós acenando à janela. O sabor das laranjas colhidas ao sul e dos figos roubados aos cactos.

A descoberta é saber que quero as intermitências. É na ausência que a verdade se revela. Una e singela, uma imagem.

Uma imagem repetida todas as noites:

A minha: uma casa clara, um pinheiro, o cheiro do lodo.

 

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