quinta-feira, 17 de julho de 2014

Dentro


Eu sei que pouco me perguntam sobre esta cidade do passado presente mas eu também pouco tenho a dizer. Apaixonada? Acho que não, aqui não me pudeste seduzir. Talvez já tivesse vindo de coração cheio, e sobrasse pouco para amar as ruas iluminadas em tom sépia, as velhinhas a vender flores no metro e todos os homens de pedra sustentanto impossíveis varandas aos ombros. Como gosto desses homens, ergendo irremediáveis, eternas toneladas, sujos de fuligem. Como eu imagino todas as pedras desta cidade erguidas da mesma forma, por semelhantes homens suados e gastos. É por isso que às vezes, quando olho as casas adornadas, só vejo sacrifício.
Do pouco que tenho a dizer talvez seja tão pouco. Que esta é uma cidade que faz olhar para dentro. Sim, temos o rio e o calor das noites de verão que veste as pessoas como um manto. Temos os parques e as cervejas na relva bebidas por línguas poliglotas. Mas aqui eu sei que esta ausência de paixão pelas coisas palpáveis, lentamente se começa a transformar num fogo por todas as coisas intangíveis: o meu amor pelas palavras, o encanto dos corpos desenhados a carvão, a música e poesia dos mestres. Olho para dentro de mim e desço às caves da minha alma como às caves desta cidade para descobrir os primeiros instintos e os primeiros amores. Olho para dentro com a paixão que me sobra e volto a entregá-la aos lugares que a merecem. 
É por isso que de Budapeste pouco tenho a contar. Talvez precisasse desta pausa, ausente de tudo, para redescobrir em mim tudo o que a mim tenho a dizer.

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