sábado, 28 de março de 2015

Barcelona


Como gosto de voltar às cidades depois de as ter visitado. Deixo para trás os monumentos e jardins e fica só tempo para as ruas, para as caras, para os sabores. Observo as gentes de Barcelona e procuro padrões. Hoje acordei numa cidade diferente, saio à rua para a reencontrar, como uma amiga.
As pessoas ocupam mais espaço, suas esferas são largas e os espaços intercalam-se, invadem-se. As pessoas entram no meu e eu gosto. Passam-me à frente na fila, convidam-me para um café, elogiam-me a roupa, perguntam o meu nome.
Aqui as ruas são largas e leves e o ar respira-se grande. Surpreendo-me do que tinha saudades e do que não necessito. Aqui o sol entra pelas ruas, bate-me nos olhos. Eu sei que pode ser comum mas lembrem-se, há muitas cidades onde o sol não bate no chão! Fica suspenso alguns andares acima, pelas paredes de betão. Sento-me num degrau para escrever este texto e bebê-lo como quem tem sede. Eu hoje vi uma gaivota. Eu hoje vi uma palmeira. Eu entrei numa mercearia, comprei três tangerinas e ouvi a conversa entre uma senhora chinesa e três indianas, em espanhol - que fazem estudam, as três? E os vossos pais? Eu hoje vi um senhor vestindo trajes do norte de África andando pela rua. Vi uma peixaria cheia de gente. Ando pelas ruas estreitas do bairro do Raval e oiço-lhe os murmúrios, sinto-me perto do chão, perco peso. Há um burburinho de coisas que se transportam, de portas que se abrem, de conversas de esquina, de unhas de cães no asfalto, de rolamentos de skates e trotinetes. Sinto o cheiro de mercearias, de ganza, de padarias, de carne frita. E em cada janela, uma varanda. Em cada varanda, roupa estendida. Como tinha saudades dessa roupa.
É que aqui vive-se para fora. Dá se à rua o que à rua pertence. Partilha-se o indivíduo com o grupo. E janta-se depois da meia noite.
Qual será este espírito que entendo tão bem, que me faz dar por mim a andar pela rua sorrindo, que me faz entender que preciso mais da vida dos outros que pensava. Que preciso tanto de olhar para dentro das casa como de voltar a dormir à minha cama.

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